Passavam poucos minutos das 22 horas deste sábado, 19 de Abril, e o Coliseu Club, no coração de Lisboa, preparava-se para receber a noite Santo Antão Jazz Clube, uma curadoria do Rimas e Batidas dedicada ao novo jazz português.
Os primeiros a subir ao palco foram os SAMALANDRA, trio composto por Débora King (teclas e voz), Tiago Martins (baixo e samples) e João Neves (bateria), que aproveitaram para aquecer a sala morna — e ao mesmo tempo fresca, inaugurada no início deste mês — com os temas do seu EP homónimo editado em 2023.
O espírito jazzístico está mais do que presente no corpo sonoro a que estes três músicos dão vida com os seus instrumentos — o método da experimentação, a apologia à criatividade e a preferência pelo risco sónico que ousa cruzar a linguagem tradicional do jazz com estéticas electrónicas ou mesmo hip hop.
Só assim uma música centenária como o jazz se mantém realmente viva, em mutações constantes que determinam a vitalidade de um género que sempre significou liberdade — ainda que, nos circuitos mais conservadores e académicos, muitas vezes apareça travestido de rígido e austero. Os SAMALANDRA, como outras bandas da sua geração, levam-no por outros caminhos — e no Coliseu Club apresentaram algumas das incursões mais recentes, ainda por gravar e registar em disco.
O ritmo acelerou quando a segunda banda entrou em palco, numa noite que contou com um DJ set do director do Rimas e Batidas, Rui Miguel Abreu, a intercalar os diferentes momentos. Os YAKUZA lançaram 2 no ano passado, um disco que foi aclamado como um dos melhores do ano na música portuguesa e que também mereceu essa distinção no Rimas e Batidas. Ao vivo, são um portento. Com uma velocidade explosiva e um vigor notável, levam o jazz por uma viagem que tanto vai ao sabor do rock como às texturas e ambiências da electrónica.
Certo é que será difícil ficar parado quando estes virtuosos pegam nos seus instrumentos e transportam uma sala pomposa na baixa da capital para o frenesim urbano que evoca as suas vivências em zonas como a Penha de França ou a Picheleira — o jazz assenta-lhes bem, mas também há um espírito punk na maneira como pegam e tocam nos seus instrumentos, na forma de estar em palco.
As luzes apagaram-se e a sala composta reagiu em conformidade, com os corpos a balançarem e os pés, ainda que tímidos, a teimarem não ficar quietos. É inevitável com a música frenética e intensa dos YAKUZA, que tem groove e acima de tudo carácter — o mais importante nos dias que correm e sobretudo quando se integra, de forma lata, um movimento-tendência, do novo jazz londrino e das suas múltiplas heranças de que tanto se tem escrito nos últimos anos, muito também nestas páginas. E com promessas de futuro, mas também certezas do presente, se fez a noite do Santo Antão Jazz Clube.