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Fotografia: naz.ptt
Publicado a: 07/02/2025

Uma alfaitaria de outros tipos.

Van Zee & FRANKIEONTHEGUITAR: “Usámos samples de músicas que têm um peso no nosso caminho pessoal e artístico”

Fotografia: naz.ptt
Publicado a: 07/02/2025

Van Zee e FRANKIEONTHEGUITAR deram o pontapé de saída deste 2025 em grande estilo, a fazer abanar a cultura com esta reimaginação de alguns dos maiores clássicos da música portuguesa. É exatamente a premissa de Alta Costura, que pegou nesses temas que marcaram a adolescência da dupla e lhes deu uma roupagem diferente: sacudir algum pó, olhar às modas dos tempos que correm, equilibrar a balança da nostalgia com a da inovação e aí está — alfaiataria de qualidade. 

Um conceito refrescante e pouco visto na música portuguesa, sem grande justificação aparente, talvez devido ao processo de sample clearing conseguir ser uma verdadeira dor-de-cabeça. Enfim, uma zona cinzenta que parece agora ganhar alguma cor com este projeto destemido de Van Zee e FRANKIEONTHEGUITAR, que não se demonstraram muito preocupados com essa parte burocrática até a artística estar praticamente finalizada. 

Mais do que qualquer qualidade musical, que é sempre subjetiva e bastante individual, esta Alta Costura é uma peça atrevida e arrojada pelas linhas que a cozem, num formato invulgar para a música nacional — e que refrescante soou. Se a porta a este tipo de homenagens tão “descaradas” parecia fechada na música portuguesa, Zee e FRANKIE parecem-na ter aberto quase totalmente. Por isso mesmo, o Rimas e Batidas falou com ambos os artistas à margem do lançamento deste disco. 

Ainda sem datas de apresentação oficiais, o duo diz estar a explorar essa opção, mas por agora apenas Van Zee sobe ao palco dos Coliseus, hoje em Lisboa (esgotado) e dia 15 de fevereiro no Porto (ainda há bilhetes).



Antes de mais, quem é o Henrique Ruben? Calma, é o Rick Rubin? [risos]

[Van Zee] Ya, ya [risos]. Imagina, tínhamos meio uma private joke quando alguém vinha com inputs daqueles mesmo geniais dizíamos “é um Rick Rubin guy”, “é o Rick Rubin da zona”, ’tás a ver? [risos]. Então a dinâmica era “baza mostrar ao mundo o Henrique Ruben.” Pegámos no Gonçalo Oliveira que interpretou o papel e o entendeu a cem por cento. A nossa ideia inicial era ter dois traditional cotas da tasca a dar-nos feedback, mas sentimos era mais fixe termos o nosso próprio Rick Rubin, ya, foi giro, foi uma referência interessante à culture para quem apanhou. Senti que houve muito mais gente que apanhou do que estava à espera.

Quando lês Henrique Ruben, a parte gramatical, passa-te ao lado. Mas quando lês e dizes em voz alta, acho que quem conhece chega lá. Esse tal Gonçalo Oliveira era uma pessoa aleatória ou foi mesmo um ator?

[Van Zee] Foi mesmo um ator, quisemos ir à procura de alguém que encaixasse bem no papel.

[FRANKIEONTHEGUITAR] Sim, como essa personagem tinha falas mais concretas, se calhar era fixe termos alguém que interpretasse bem essa personagem.

[Van Zee] Foi a primeira vez que gravámos um sketch na vida, do nada aparece lá o Gonçalo Oliveira, dá a sua respiração funda antes de começar a gravar… “Ah ok, this is for real.” Não estamos mesmo a par de como se deve fazer as coisas, foi logo um ice break no lado das gravações.

Este sketch pré-album é uma ideia genial. Inspiraram-se em algum tipo de sitcom/show de comédia ou assim? 

[Van Zee] Um bocado em The Office e assim, assim estilo filmagem, aquele awkward humor. O mais engraçado é que toda a narrativa do “E a capa?” é completamente made-up, provavelmente foi a primeira coisa que tivemos feita, mano, não houve stress nenhum mesmo [risos].

E eu a pensar que tinham tido problemas nisso e se inspiraram para este pequeno vídeo…

[FRANKIEONTHEGUITAR] Por acaso não, foi mesmo para o plot da cena. 

Foi algo mesmo refrescante de ver na música portuguesa, é raro ver este tipo de conteúdos. 

[Van Zee] True e não muito difícil de fazer. Não é high bugdet, acho que acaba por ser ideias over budgets. Se tiveres grandes ideias isso não se paga. Se fizer sentido, faz sentido, e neste caso quando vimos pela primeira vez o episódio todo foi tipo “ah ok!”, porque tínhamos zero noção de como ia estar. 

Nós acabamos por ser sempre os nossos maiores críticos, por isso em algum momento acharam que estava a ficar cringe ou assim? 

[FRANKIEONTHEGUITAR] Imagina, falando por mim, a gravar não tenho o maior à-vontade e isso, mas durante a gravação com o Zee parece que a pressão se dividia um bocado e encarei a cena como “vamos só gravar de forma natural” e depois, na edição, é que fiquei pensativo.

O produto final conquistou-vos logo? 

[Van Zee] Fartei-me de rir! Por isso sabíamos que todas as preocupações de que pudesse estar cringe não existiam, pelo menos para nós. Isso acaba por ser o mais importante, o feedback foi bué positivo, acho que as pessoas entenderam a dinâmica. Queríamos um ar fresco no nosso trabalho, senti isso com este álbum todo, foi o objetivo, tanto para a percepção do game como para a percepção da nossa própria música, dos nossos lançamentos e dos nossos rollouts, era isso que queríamos.

Nesse sketch também aparece uma senhora a costurar um patch num casaco que diz “Alta Costura”, estão a pensar fazer merch disso? 

[Van Zee] Estamos a trabalhar nisso. Fun fact, agora estou eu a costurar, comprei uma máquina de costura e agora sou eu que estou a aprender a costurar. Se começarem a sair one out of once, não achem que eu sou louco, estou exatamente onde quero estar. 

Um Virgil Abloh do game português a caminho?

[Van Zee] Acho que é fixe o facto de um meio artístico te conseguir inspirar para veres os outros meios todos como mais. O que se calhar antes ignoravas, agora interpretas de outra forma. Acho que até o Frankie neste projeto começou a interessar-se mais por moda, e eu, que já tinha algum interesse, aprofundei-o. É interessante uma consequência de fazeres música também ser interessares-te por mais coisas em outros meios. 

No hip hop, a moda está umbilicalmente ligada. 

[Van Zee] Tens o streetwear, tens o graffiti, tens o breakdance, sempre foi um conjunto de coisas, se calhar antes não vias como um rol de coisas, mas era meio um whole package, era algo natural. Agora sinto que há mais chances para toda a gente explorar.

Descobri um tweet de um fã vosso a pedir uma colaboração entre vocês, isto em janeiro de 2023, há pouco mais de 2 anos. Foi aí que se conheceram?

[Van Zee] Foi basicamente nessa altura, início de 2023. Lembro-me que foi pouco tempo depois de lançar a “Alma Nua”.

[FRANKIEONTHEGUITAR] Lembro-me que trocámos mensagens, o Zee vinha a Lisboa fazer umas cenas, estivemos em estúdio e a partir daí, ya, desde então andamos a fazer bué música. Este projeto surgiu naturalmente, durante o ano fomos fazendo as nossas coisas individualmente e também fizemos música que não saiu, entre os dois, e só tínhamos um tema em conjunto cá fora, a “O Amor É Mesmo Assim”, que fizemos em setembro e só em outubro/novembro é que começámos a trabalhar a sério neste projeto e foi bué natural. Fizemos a segunda música em que samplamos também outra música portuguesa antiga e o Zee pensou “bora fazer um EP”, depois começámos a fazer mais e mais e fez sentido ser um álbum. 

[Van Zee] Tirámos uma fotografia dos últimos meses da nossa vida e acho que o álbum transparece mais a mensagem do que se fosse só um EP ou um projeto que não tivesse o seu destaque. Acho que também é fixe isto ter o seu destaque, mesmo que seja pouco convencional para os dois, foi algo meio relativamente rápido, foi o acumular de fazer muito sem um propósito e quando o encontrámos quisemos trabalhar nele, quisemos afunilar o scope de tudo isso. 

Acaba por ser um projeto engraçado neste género do hip hop, algo irónico pelo seu conceito de sampling ser tão “frontal” e direto, ou seja, não mascararam nada, está tudo muito raw e bastante atingível para quem ouve, é fácil descobrir quem estão ali a samplar. Foi exatamente ao contrário daquilo que vemos normalmente no hip hop.

[FRANKIEONTHEGUITAR] A primeira música que surgiu foi no final do verão, estávamos a trabalhar numa ideia, já tinha mais ou menos o beat, ele começou a escrever e depois foi natural a ideia. Por acaso temos um vídeo em que o Zee diz “que música poderia ficar fixe aqui?”, e surgiu a “O Amor É Mesmo Assim” dos HMB. Quando começámos a fazer o projeto decidimos que era fixe serem músicas portuguesas para ter um conceito mais coeso e também para, lá está, como estamos a usar mais “descaradamente” as músicas, para termos os sample clearances mais facilmente optámos por isso. Mas também não foi pegar em música portuguesa por causa da tal portugalidade e isso, foi bastante natural.

[Van Zee] São samples de músicas que têm um peso no nosso caminho pessoal e artístico, então vamos dar o nosso twist. Lá fora fazem, porque é que nós não podemos fazer com música de cá? O que não falta aí são type beats com samples de músicas gigantes. Acho que, em Portugal, fazermos isso com música portuguesa é fixe, tornar isto mais normal e todo o processo de clearance mais normal. Gostamos da ideia da nostalgia estar descarada, a voz do Bezegol, para mim, naquele beat faz-me logo viajar no tempo. Nem que fosse só uma melodia… Na “Atitude” usámos só o instrumental do Virtus, por exemplo. Na “Como Seria? / Amor Sóbrio”, como já usamos o refrão, não preciso de fazer tanta referência. Nos dois casos dá um feeling diferente, dá para explorar de formas diferentes, tanto com a voz como o instrumental. 

Esse fator nostalgia que falas no sampling normalmente costuma ser usado em cenas mais antigas, coisas com várias décadas, e vocês usaram coisas minimamente recentes. Tirando 2 ou 3 temas, é tudo coisas recentes, deste século. 

[Van Zee] É porque nós também somos putos, at the end of the day os nossos clássicos também vão ser os sons que acompanharam o nosso crescimento. Os sons que falei há pouco do Deau/Bezegol e do Virtus, bro… ouvi esses dois sons muitas, muitas vezes. É a melhor forma de demonstrar o respect pelos temas, inspirar-nos neles e seguirmos a sua ideia. 

[FRANKIEONTHEGUITAR] feedback positivo que tivemos deles depois de ouvirem o produto final foi bué bonito. Claro que se quiséssemos samplar só por samplar, os artistas não tinham que gostar efetivamente do que fizemos, mas todo o feedback que tivemos deles faz o projeto ainda mais bonito para nós. 

[Van Zee] Nos casos dos Azeitonas e Toranja não é expectável para eles que nós fizéssemos isto, e provavelmente não é para muita gente, mas no hip hop o sampling é o pão nosso de cada dia, se calhar foi das culturas que se criaram à base do sampling. Ver isso a ser feito em Portugal, pelo menos eu senti, especialmente do Virtus e do Deau, um carinho diferente do que o resto da malta que acharam uma novidade e gostaram por ser diferente. Agora, pessoas que já estão acostumadas ao processo de sampling verem dois “putos” samplarem um projeto deles foi-me bué gratificante, não foi visto como uma coisa: “Epá este putos a usarem a minha música e nem gosto disto”. Os artistas relacionarem-se com a música que fizemos contribui para não estar a sentir tanto o síndrome do impostor [risos].



Há pouco disseste que chegou a uma altura que tiveram de afunilar, houve samples que ficaram de fora?

[FRANKIEONTHEGUITAR] Não propriamente, porque no processo de fazermos as músicas experimentámos e não fizemos logo, logo um tema, fomos experimentando samples de músicas que faziam sentido mas depois acabaram por não resultar por várias questões, como a atmosfera do beat ou da voz que não colavam tão bem. Por isso, havia outras músicas mas ficaram de fora.

[Van Zee] Quando falei em afunilar, foi porque tanto eu como o Frankie fizemos imensa música no último ano, acho que temos um workflow de criar, criar. Isso também vai nos exercitando e acabas por ter mais naturalidade a fazer música. O afunilar foi mais numa de olhar à curadoria do que tinha feito no ano passado e olhar a algumas barras que podia usar, não as ia deixar no esquecimento e fazer tudo de raiz. Dentro do meu bolo de de ideias foi ver o que podia ser usado neste projeto. 

Nesse processo de sampling, podem referir que sons ficaram de fora?

[FRANKIEONTHEGUITAR] “A Máquina” dos Amor Electro, “Manga” da Mayra Andrade, que meio que acaba por aparecer sob forma de interpolação na “Fica Só.” que tem um sample do B Fachada, aparece mesmo no final do som, de uma forma meio abstrata, mais lowkey, quem conhece vai apanhar. Mas era para ser mesmo um sample nesse caso.

E o processo de clearance, um assunto que dá dores de cabeça cá em Portugal, como funcionou no vosso caso? 

[FRANKIEONTHEGUITAR] Nós fizemos as músicas e às vezes dava por mim a pensar se teríamos essa clearance, mas foi um bocado só fazer acontecer a nível musical e depois é que nos preocupámos com isso. Na semana final em que fechámos o álbum é que começámos a pensar nos clearances que tínhamos para fazer e foi relativamente fácil. Mandámos mensagens diretamente aos artistas, a nossa editora Universal/Virgin ajudou-nos também com isso para chegarmos a outros que faltavam, foi por acaso mais fácil do que estávamos a imaginar. Nesse momento do trabalho estávamos algo receosos que pudesse não funcionar e acabou por correr tudo bem, foi mais ou menos fácil. 

Houve algum tipo de resistência por parte de algum artista ou foi tranquilo desde a primeira abordagem?

[FRANKIEONTHEGUITAR] O primeiro, porque o single era a “Quem És Tu?”, era um sample de Os Azeitonas. Mandei mensagem ao Miguel Araújo no Instagram e se ele não respondesse tentava por outras vias, mas no dia a seguir respondeu e disse que era na boa por ele. Pediu-me só para falar com os outros dois autores, o João Salcedo e o Marlon Brandão, que também disseram que era ok para eles. Nas mensagens explicámos o conceito do projeto e o que estávamos a fazer, pronto, foi à base disso.

[Van Zee] O processo está dividido em duas partes! Tens de ter o approval do dono do master e também do autor e dos co-autores. Não é que exista uma máquina oleada em Portugal, mas foi bem mais acessível do que estávamos à espera. 

[FRANKIEONTHEGUITAR] Sim, depois de termos a aprovação foi combinar percentagens, obviamente.

[Van Zee] Exato, tentámos ser justos com toda a gente e ter um standard. Acho que as pessoas também entenderam, viram como uma homenagem, até pessoas que não teriam que ver como uma homenagem e podiam ver a nossa música como um alien ficaram super tranquilas e viram o nosso projeto como uma forma de homenagear músicas que realmente gostamos e tiveram um peso na nossa vida. 

Conseguiram feedback de toda a gente? Exceto quem já não está entre nós, como é claro.

[Van Zee] Ya, ya. O B Fachada até nos mandou um email super bacano. Aqui estávamos a trabalhar mesmo, mesmo com artistas, não só artistas pop ou um artista rock, é malta que aprecia arte de todas as formas e conseguem reconhecer, senão qualidade, pelo menos beleza e homenagem mesmo que seja noutro género de música. 

Sentem que este projeto é um statement na música portuguesa? 

[FRANKIEONTHEGUITAR] O statement, primeiro, acho que é para nós, sentirmos que com este projeto fizemos algo diferente e novo do que costumamos fazer. Posteriormente, acho que a sonoridade está um bocadinho diferenciada do que está a ser lançado nos últimos anos. Isso foi um dos motivos que nos fez querer muito lançar este projeto. Depois, o álbum está lançado e cada um há-de ter a sua percepção do álbum e até agora o feedback está a ser muito bom. Acho que só o tempo dirá se vai ser um projeto que marcou a música portuguesa ou não. 

A nível musical, como foi chegar à fórmula perfeita nos samples e interpolações? Deve ter sido um trabalho interessante.

[Van Zee] Foi bué pelo feeling. Por exemplo, na “Como Seria” nós já tínhamos uma música que se chamava “Amor Sóbrio”, é por isso que ficou “Como Seria? / Amor Sóbrio”. Aquela parte inicial não existia, sinto que para mim é a minha parte preferida, já existia um som que eu gostava imenso e o facto da sample existir abriu uma porta para entrar nesta música. Acaba por ser uma das minhas partes preferidas do álbum todo porque já existia essa sample

[FRANKIEONTHEGUITAR] Eu já produzo música há uns 5/6 anos, mas no início era um processo de estar com outros produtores e dar o meu feedback, e só há 2 anos é que comecei mesmo a produzir e a fazer os meus próprios beats. Este ano que passou sinto que cheguei a um workflow fixe, que funciona comigo, na base da experimentação. Tenho uma ideia, vou experimentando vários sons até chegar a algo que mexa comigo e eu acho que seja suficientemente “bom”. O processo de sampling foi assim, fui experimentando, colocar efeitos, dar chops, mudar tons, etc. Não há um standard de sampling no projeto. Como falámos há bocado, há músicas que pegamos só no instrumental, outras pegamos só na voz, como houve vários processos, foi tudo na experimentação. A maior parte dos beats estavam com o Zee, ele a escrever e fomos tendo um back and forth de opiniões da sonoridade que queríamos alcançar.

Há muito sampling feito à base de discos que o produtor desconhece totalmente, coisas aleatórias que encontra, ouve algumas vezes e começa a trabalhar. Aqui não, são temas que vocês conhecem bem, há uma ideia pré-concebida de como está a soar. Tiveram que desconstruir um pouco essa percepção… 

[FRANKIEONTHEGUITAR] Eu e o Zee fomos arranjando músicas que achavamos que podiam funcionar e faziam sentido para nós samplarmos, foi um bocado isso. 

[Van Zee] No processo de sampling explorámos um bocado algumas sonoridades que andamos a consumir agora, portanto isso influenciou logo o produto a que queríamos chegar. Nunca olhámos para estes temas como um ponto final, queríamos dar um tweak, era muito à base de experimentar, sabíamos que algo ia encaixar.

Foi um projeto relativamente rápido de ser feito, começando em setembro/outubro. 

[FRANKIEONTHEGUITAR] Lá está, foi o momento de cada um a nível de produção e de escrita, depois chegámos a estes 2/3 meses e fizemos o projeto. A base das canções foi relativamente rápida e instantânea, tirámos uma foto daquele momento, da nossa vida, daquela sonoridade, foram momentos rapidamente gravados se é que me entendes. O projeto foi muito espontâneo e rápido. 

E na parte lírica, fluiu rapidamente a parte de criar algumas interpolações, Zee?

[Van Zee] Cada vez mais vejo fazer música como um puzzle, ou seja, fazes um refrão e isso ajuda-me a completar o puzzle, para não parecer um caminho sem fim até acabar o beat, para ter um esquema mental. Na “Amor É Mesmo Assim”, ter o sample facilitou-me um bocado escrever o verso, trouxe referências do refrão, fez-me mais sentido mentalmente. Não sei explicar a 100% porque não compreendo a 100% o meu processo e acho que nunca vou conseguir perceber. Às vezes até servia de bengala ir buscar uma referência ao som, como foi com o José Pinhal, mesmo que não seja diretamente, porque estou a falar de coisas completamente diferentes dele nessa música, mas mesmo assim consegui ir buscar referências. Apesar de falar de coisas completamente distintas consegui usar algumas referências do artista original. 

O nome Alta Costura surge por isto ser uma homenagem à música portuguesa com uma roupagem nova/diferente? 

[FRANKIEONTHEGUITAR] Por acaso já tínhamos o álbum praticamente feito mas ainda não tínhamos o nome do projeto, mas um dia eu, o Zee, e o nosso manager Simão juntámo-nos e estivemos em brainstorming durante umas horas com um quadrozinho e surgiu este nome. Faz sentido por darmos uma roupagem nova, de ser costura de samples, partes de letras, melodias e a cena toda fashion também que o Zee está bué presente e eu neste projeto também me interessei mais. As próprias músicas também têm muito esse input

[Van Zee] Sim, sinto que estou numa fase que estou a adorar descobrir mais sobre moda. Eu tenho muitas love songs e conseguir usar a moda para passar essa mensagem também acho fixe, não tem que ser sempre óbvio. Não é pelo sentido literal da palavra mas mais por ser algo que eu gosto, deixa-me representar o amor — que é algo central na minha vida — com estas coisas que me vão interessando. “Fixing her up with some Chanel” também pode ser um “amo-te”.

O Zee naquele famoso sketch deu as suas “Ten Things I Can’t Live Without”, e tu Frankie? 

[FRANKIEONTHEGUITAR] Não sei se tenho dez coisas… mas tenho este PC onde estou agora a fazer esta chamada, que é onde tenho a minha vida toda. Várias pessoas com que trabalho gozam comigo por não ter grandes backups de nada. Estou na fé, se alguma vez acontecer alguma coisa, é porque teve de acontecer. Guitarra não pode, telemóvel também… Não sei, não tenho muitas coisas, é mesmo este PC que tem a minha vida. 

[Van Zee] Podes mesmo escrever em grande na entrevista “ONDE TENHO TUDO”, que é para o people estar mesmo a par [risos].

Zee, achei interessante o sample da “Bravos”, porque para além de ser uma cena açoriana é do Zeca Afonso, certo? 

[Van Zee] Sim, a letra é de marinheiros açorianos, tanto que é de domínio público. Acho bué interessante essa sample em específico porque comecei a ouvir mais hip hop e essa música cativou-me também. Não sei porquê, a música não faz de todo parte do género, talvez seja pela interpretação do Zeca Afonso ser tão genuína que me puxou. 

Por falar em ilhas, também samplam um conterrâneo teu, que é o Max na “Insular”.

[Van Zee] Esse som surge mesmo pelo lore de vida jovem na Madeira. Há um club no Porto Santo que toda a gente vai quando está de férias em agosto e no fim da noite tocam este tal “hino do Porto Santo” que não é hino, mas fez parte de tipo 300 verões meus. Eu já tinha tentado samplar isto em 2019, mas não estava a soar bem e agora fez todo o sentido, era a melhor chance de o fazer. Sei a letra do original bar for barword for word [risos]. É uma cena bastante regional, já aprendemos sobre ele na escola.

O “Atitude” explora uma vibe mais de bossa nova, é algo para manter no futuro?

[FRANKIEONTHEGUITAR] Desde miúdo que os meus pais ouvem muita música brasileira e há muita coisa que vou agora redescobrindo porque não ficava com os nomes presentes na cabeça em miúdo. A música brasileira transmite uma vibe e tem uma essência única. Acho que a música que fazemos é sempre um espelho de toda a música que ouvimos em miúdos, nem que seja um tema que ouviste uma vez. Tenho muito esse sentimento de nostalgia de ouvir uma música e saber o sítio onde estava, com quem estava, o contexto onde estava, e a música brasileira faz-me muito sentir isso. No meu último projeto a solo, o EP jULY, há um bocado essas vibes e seguramente vou continuar a ter umas coisinhas assim. O Zee também gosta muito desse estilo de música.

[Van Zee] O meu pai ouvia imenso Tom Jobim, Caetano Veloso, apanhei imenso bossa nova. A minha mãe, holandesa, adorava Mayra Andrade, ou seja, também apanhei alguma música cabo-verdiana. Mesmo que tenha sido só uma porta de abertura explorei imenso esses pequenos interesses que os meus pais tinham. Tenho explorado imensas ideias assim em beats mais soulful e jazzy, que também são a base do bossa nova. 

Para este projeto, estão a pensar fazer alguns concertos de apresentação?

[Van Zee] Estamos a explorar isso. Tenho agora os dois concertos nos Coliseus a solo também, ainda há bilhetes para o Porto, a 15 de fevereiro. Escusam pedir mais porque não vai abrir, agora é Porto, Porto [risos].  

Há pouco falaram de merch para o álbum, temos novidades?

[Van Zee] Estamos a trabalhar algumas ideias. Talvez roupa e uns patches. A nossa dica com patches era fazer algo mais contínuo, tipo várias versões, umas mais exclusivas, outras menos, estamos a explorar que opções fazem mais sentido. Queria agradecer também a toda a gente que contribuíu tanto a nível de cederem samples mesmo como na criação e no trazer o nosso conceito para a vida real, o Daniel Pato e o Ruben Mendes foram fulcrais no vídeo, também por puxarem por nós para sairmos da nossa zona de conforto porque é isso que a música devia ser. Às vezes é preciso uns estímulos externos, ou ter pessoas com visões parecidas contigo para saírem todos da zona de conforto e fazer coisas inovadoras que nos diferenciem de nós próprios do passado e todas as pessoas como individuals. 

Há uns tempos, vi o Freddie Gibbs a tocar a “Crime Pays” ao vivo com a Clairo e agora lembrei-me disso para este projeto. E que tal Van Zee & Frankie com Azeitonas/Toranja/HMB/Expensive Soul em palco? 

[Van Zee] That’s something we can’t tell you, it’s something we gotta keep working on… [risos]


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