Foi ao techno que chegou e é do techno que parte para as suas incríveis explorações musicais, usando a síntese modular como um escultor usa a pedra, para daí extrair formas, sentidos, uns mais concretos, outros mais abstractos, mas todos resultantes de uma curiosidade incontrolável: o que se encontra do lado de lá de um pulsar, até onde a repetição nos pode conduzir, com quantas frequências se abala a realidade?
Van Der responde a estas perguntas todas com a música que cria e impõe mais umas quantas certamente. Primo de Marfox e com ligações à extensa família da Principe, Van Der tem no entanto trilhado um caminho muito próprio que o tem levado a viajar de Berlim a Lisboa, do Lux ao Semibreve e mais além. Amanhã, sexta-feira (1 de Novembro), apresenta-se na primeira parte de Angry Blackmen na sala Lisa, em Lisboa. Pretexto para uma breve conversa após encontro não programado no Semibreve.
Acabaste de te apresentar no Semibreve. Como correu?
Correu muito bem, acima das minhas expectativas. Estava com alguma ansiedade há vários dias, com dificuldade em adormecer, até porque tinha tocado no Lux no dia anterior, sentia-me muito cansado. Por outro lado, penso que esse mesmo cansaço ajudou-me no no final das contas, como se estivesse em “piloto automático”, no bom sentido. As pessoas gostaram, fui congratulado pela noite em diante, estou muito satisfeito.
Esta semana passas pela Lisa, em Lisboa. Abordas datas em clubes da mesma forma que abordas apresentações em festivais?
Sim, irei fazer um live antes de Angry Blackmen e em seguida um DJ Set. Abordo as datas de forma distintas mesmo entre clubes, depende também do alinhamento, da proposta conceptual. No caso do festival, eu acabei por decidir nos últimos dias antes do Semibreve sobre que abordagem iria fazer em termos de live. Neste formato, as pessoas têm-me visto a explorar música considerada exploratória, ora mais melódica, ora menos tonal, e essa é uma dimensão que emergiu em mim e que quero continuar a trabalhar, embora a razão inicial pela qual tenha entrado no mundo da criação musical tenha sido a partir do techno, género musical que continuo gostar muito. Considerando o momento e o palco em que iria tocar, optei por fazer um live de techno. No fundo, eu apenas quero expressar-me das mais variadas formas e não ficar colado aos rótulos.
Guia-me, por favor, por um set típico teu num clube: tocas só produções próprias? Usas faixas já terminadas, recorres a loops e vais montando as peças em tempo real? Como funciona o teu processo? E já agora que ferramentas usas?
No contexto de live sets, já recorri a todos esses processos. A maior parte dos lives que fiz até hoje, foram com o sistema de modulares, nesse caso costumo criar um patch, uma ideia, e tento explorar essa ideia durante o período de duração do live. Portanto, sei onde começo mas não sei onde vou parar. Há meses atrás adquiri um sampler e optei por utilizá-lo pela primeira vez em contexto live, inicialmente por uma questão de logística, porque não tinha uma mala com cobertura para o sistema modular, o que dificultava o transporte do mesmo, decidi então usar o sampler, tendo recorrido a produções que criei nos últimos 2/3 anos. Esta forma revelou-se como uma oportunidade de partilhar composições que de outra forma não seriam escutadas, esse método permite-me também improvisar, recorrendo às ferramentas disponíveis no sampler e aplicando efeitos, fazendo loops, etc. Portanto, diria que quero continuar a explorar ambas as formas e encontrar uma forma híbrida de as utilizar, como ja foi feito no live do Semibreve.
És um apaixonado por síntese modular. Podes explicar como integras essas ferramentas criativas no teu processo composicional?
Penso que acabei por responder em parte a essa pergunta na resposta anterior, mas diria que tenho utilizado a síntese modular como a primeira referência em todas as composições. Não consigo expressar-me da mesma forma com outros sintetizadores “convencionais”, existe uma certa imprevisibilidade que é importante saber abraçar. Normalmente o resultado do que decido gravar já é o resultado final, porém, eu reconheço um potencial enorme na criação de samples e penso que poderei vir a fazê-lo com maior frequência.
Como descreverias a música que fazes?
É uma pergunta tricky. Eu prefiro mesmo que as pessoas descrevam a minha música a partir da forma como elas se sentem quando são expostas à mesma. E a música que elas ouvem num contexto pode não ser o que irão ouvir num outro contexto. Há ano e meio os meu lives eram à base de melodias sequenciadas por arpeggiators, tinha tanto de etéreo como de nostálgico. Hoje em dia tenho explorado texturas menos coloridas. Ainda assim, faço outras “coisas” que não se enquadram em nenhum destes espectros.
Quais são as tuas maiores referências em termos de produção?
São muitas as referências porque penso que tudo influencia, inclusive a música dos videojogos de quando jogava Nintendo 64. Eu sou daquelas pessoas que vai revisitar a música dos videojogos na Internet, mas pronto, a título de exemplo indico: James Stinson, Gerald Donald, Juan Atkins, Mike Banks, Jeff Mills, Robert Hood, Surgeon, Stanislav Tolkachev, Oscar Mulero, Regis, Basic Channel. Gosto muito também de Alva Noto, Mika Vainio, Gäs, Autechre, Boards of Canada, Aphex Twin.
Só gente boa… E tens planos para editar música? O que podemos esperar nesse sentido?
Neste momento está em fase de preparação um EP, ainda não posso revelar muitos detalhes. Tenho várias pessoas amigas interessadas em escutar o que tenho feito e, quem sabe, vou avançar na direcção da materialização de um corpo de trabalho.