Se o rap nasceu para resistir e lutar, não há força da natureza que o extinga. Aqui o bicho só se manifesta nas rimas e batidas, e os nossos soldados não baixam canetas nem no pior dos cenários.
De semana em semana, há novas linhas por decifrar, novos sons por escutar, novas dicas (*) para encaixar. Seja em português ou em crioulo, do masculino ao feminino, desde as maiores estrelas nacionais aos mais anónimos rappers de sótão, do trap ao drill, há espaço para tudo o que nos faça abanar a cabeça. Por dentro e por fora.
[UEST.] “7Min Drill”
Quando foi J. Cole a fazê-lo, o tiro saiu-lhe pela culatra quando o próprio assumiu a faixa que visava Kendrick Lamar como “the lamest shit I ever did in my fucking life”. UEST., por sua vez, não terá seguramente esse problema mais à frente, desde logo porque nada no seu “7Min Drill” se afigura comprometedor. Ademais, no caso do rapper e produtor portuense, o exercício foi outro: levar a coisa à letra e fazer um drill (no sentido de exercício — escrito, leia-se) em sete minutos. Missão cumprida.
[Farrusco & Chapz] “Suco Drástico”
É por esta altura uma autêntica parceria com múltiplos frutos colhidos: Farrusco e Chapz somam já várias colaborações conjuntas em nome da Zona Recs, a última das quais passou, precisamente, por esta sede enquanto última novidade do rapper de Odivelas. Desta vez com Catalão na composição instrumental, “Suco Drástico” traz à tona a mistura que resulta do cruzamento entre ambos: uma acidez exótica.
[Johny Malibz & NastyBee] “South Funky”
“South Funky” encerra em si um daqueles casos em que o nome diz tudo. E serviu o Imprensa Cocktail & Oyster Bar, no Príncipe Real, para acolher o sabor explicitamente funky destes representantes do hip hop feito a partir da Margem Sul do Tejo. Cruzaram-se, então, o almadense Johny Malibz e o colectivo de Setúbal designado NastyBee para uma sessão de comes e escreves, rimas e bebidas.
[Kristóman] “Riquezas”
Depois de um longo e proveitoso ciclo dedicado a Another Situation — disco que marcou o regresso de Kristóman às edições a solo, oito anos depois da última —, o rapper algarvio volta aos lançamentos em nome próprio com “Riquezas”, ao lado de Jean Richard. Single este que espelha o estado de espírito do MC de Loulé ao fim destes anos todos de rap aos ombros: colher os frutos que a maturidade lhe trouxe e aproveitar cada etapa da viagem doravante.
[LEFT.] “Violento” feat. L-ALI
Estão ambos mais perto do que uma outra dupla como os Paris Texas poderia congeminar a duas cabeças, mas também não foi para um catálogo rígido e estanque que tanto LEFT. como L-ALI assinaram papéis no Contrato-Promessa de Rimas e Batidas (CPRB). Surpreendente, sim, mas tudo menos inusitado, portanto, este “Violento”, um grito de descompressão de António Graça que ressoa em Hélder Sousa e Inês Barroso (aka Rossana), e abre caminho a LIMBO, primeiro álbum cantado em português pelo cantor e produtor, ainda por estrear.
[Plutonio] “Luxemburgo”
“Um filme de Francisco Ramalho”, porque nesta indústria já o cinema se confunde com a própria música. E já lá vão os tempos em que as maiores estrelas pop do globo — hoje, muitas delas “estrelas hip hop” — figuravam em telediscos circularmente coreografados em torno da própria canção, sem grande inventividade para lá dos cenários idealizados à volta das poses do protagonista. No fim de contas, mais James Bond do que Justin Timberlake. E é nesse novo papel que Plutonio encarna a personagem principal de “Luxemburgo”, mais um tema à escala real da ambição e dimensão do rapper que tem reservado para o próximo ano o palco da MEO Arena. Portugal só é pequeno para quem o vê com essa lente…
[Pika x TK x Uno] “Os Corpos Flutuam””As viagens têm início e fim.
“Também têm a viagem em si.
Os lugares mudam com o tempo.
A morte passa o testemunho.
Cada um no seu lugar. Até deixar de ser.
E assim é um mundo.
Entre vivos a morrer, entre mortos a viver.”
E nas viagens basta um piscar de olhos para perdermos toda uma paisagem pelo caminho. Tem sido esse, por vezes, o nosso pecado a seguir o rasto a Entre Vivos, álbum-filme protagonizado entre Pika, TK e Uno e realizado por Olga Ramos. Ao terceiro e último capítulo, o segundo episódio traz-nos reflexões ardentes e palpitantes. Os outros, é vê-los à vinda…
(*O título da nossa coluna, Dicas da Semana, inspira-se num clássico de Biru)