Ao longo dos últimos anos, pikika tem-se dado a conhecer através de singles e algumas colaborações. Agora, estreia-se definitivamente com um EP que tanto explora melodias R&B como cadências reggaeton, num registo melancólico-dançável que aborda os padrões relacionais de se voltar para uma pessoa com quem já não tinha resultado antes.
Sozinha e Mal Acompanhada é um disco de meia dúzia de faixas produzidas por Agir, Holympo, Bella Saint, FRANKIEONTHEGUITAR, Lunn, D’Ay e com uma colaboração com Lhast, além de incluir contributos de alguns instrumentistas. Para assinalar o lançamento, o Rimas e Batidas conversou com a cantora natural de Portalegre, que diz querer concretizar muito mais ao longo deste 2025.
Como e quando é que começaste a trabalhar activamente neste EP? Foi um processo natural de ires gravando temas e acabaste por chegar a estes resultados? Ou, a partir de certa fase, já sabias o que querias e foi mais intencional?
Isto foi tudo após o “Tenho de Pensar”, que foi em Junho. Foi nessa fase, estava a fazer vários sons e a querer conciliá-los. Não sabia bem o que queria, queria fazer o primeiro projecto, mas não sabia o quê. Não sabia se seria um álbum, se seria um EP, até que comecei a ver um fio condutor entre as músicas. Foi curioso porque a única que me faltava para seguir a história foi a “Inocência”, que foi a última a ser feita. Comecei a ligar as coisas e a perceber que isto ia dar à cena do padrão e do ciclo, de uma jornada de conhecer alguém que depois não resulta mas voltas ao mesmo… A ideia partiu daí, de ver que as coisas estavam a ir para aí. Foi algo até meio pessoal.
E foram os instrumentais que foste recebendo, ou em que foste trabalhando com os produtores, que também te levaram para aí? Ou já sabias que era isso que também fazia sentido explorares nesta fase?
Tudo aquilo que escrevo é porque está cá dentro e parece que era isso… Então levaram-me inevitavelmente para aqui porque era o que estava a sentir no momento e por isso é que ficaram todas tão ligadas umas às outras.
Como é que foi o processo criativo de trabalho com os produtores? Como é que escolheste os artistas? Foste marcando sessões de estúdio com várias pessoas e, depois, logo se via o que acontecia?
Sim, foi mais por aí. Tirando a “Só Se For Hoje”, porque essa foi começada, pelo menos, para aí em Fevereiro. Foi mesmo antes deste leque das outras e ficou na caixinha, ainda tínhamos de a acabar mas não sabíamos bem como, embora a ideia já estivesse lá. Mas aí eu estava longe de saber o conceito deste projecto. E as outras surgiram porque marquei sessões de estúdio e as coisas, inevitavelmente, levaram todas para aí.
Mas havia pessoas específicas que sabias com quem querias trabalhar?
Sim, talvez as únicas pessoas com quem ainda não tinha trabalhado eram o Agir e o D’Ay. Já tínhamos estado imensas vezes, mas nunca tínhamos feito alguma coisa a sério. Já tinha ido ao estúdio há mais tempo com o Lunn, e com o Frankie também, gravámos imensos sons juntos. Mas tinha a curiosidade de trabalhar com todos eles porque sabia que eles podiam explorar as influências todas que eu tinha e que queria meter no projecto.
E houve esse tipo de conversas, no sentido de dares uma direcção daquilo que gostavas?
Sim, falámos sempre mais ou menos sobre o que é que eu queria, mas ao mesmo tempo foi super natural. “Gosto disto assim, quero uma vibe assim: consegues misturar estas coisas?” Especialmente a cena de misturar os géneros. Eu queria mesmo as pessoas que eu sabia que conseguiam fazer isso.
E as letras surgiram após os instrumentais? Como é que funcionou esse processo? Foste pelas melodias, a partir do beat, e foste adicionando naturalmente as palavras?
Essa parte é curiosa, porque é diferente. Eu estou sempre a escrever nas notas do telemóvel. E, depois, dependendo do beat que é… Geralmente isto acontece, mas nem sempre… Por exemplo, tenho sons em que fiz a melodia e depois fui ver o que é que tinha porque sabia aquilo que queria dizer. “Ah, eu sei que escrevi há uns tempos sobre alguma coisa que estou a sentir agora”. E encaixa. Mas há outras que foram escritas de raiz. Por exemplo, a “Inocência” foi escrita de raiz e foi com a Bella Saint, o Agir e o Holympo. Acho que foi a primeira vez que estive com mais pessoas a escrever, foi muito giro. E por acaso também não sei se a “Frágil” não foi de raiz… Mas é sempre diferente.
E sentiste de alguma forma o peso de ser o primeiro EP, no sentido de funcionar um pouco como uma apresentação mais oficial do teu projecto artístico, além dos singles e colaborações que já tinhas feito?
Sim, senti, nestas últimas semanas então estava super nervosa. Mas, ao mesmo tempo, confiante, por saber que aquilo que eu queria passar — obviamente depende sempre da reacção das pessoas, porque nunca sabemos o que é que as pessoas vão sentir — mas confiante no sentido em que sei que aquilo que eu queria dizer e a forma como queria explicar está lá. Tem uma ordem, tem tudo aquilo que eu queria meter, musicalmente falando, das influências que existem, dos géneros que eu queria explorar, das letras que eu queria falar. Portanto, tenho essa confiança mas estava cheia de medo de como é que as pessoas o iam receber. Até por ter tanta fusão de géneros, que não é algo assim tão comum.
E o que é que te levou para essa fusão de géneros? O facto de tu própria, enquanto ouvinte, escutares muita coisa diferente?
Sim, não dá mesmo para escolher só uma coisa de que gosto e acho que as coisas soam melhores quando se unem. Por exemplo, adoro ouvir hip hop, R&B, bossa nova, flamenco… E quando há essa fusão, sinto que as coisas só têm a ganhar. É como se estivesse em constante mutação. Acho que a Rosalía já disse uma vez numa entrevista que, quando consegues fazer uma espécie de segunda versão dos géneros por estares a meter outros géneros diferentes, as coisas só têm a ganhar porque nunca entram em repetição.
Certo, e acabas por criar um som diferente, mais único. Mas também te perguntava sobre se tinhas sentido o peso por ser o teu primeiro EP para perceber se tinhas sido muito exigente durante o processo, se tinhas sido muito perfeccionista por ser o primeiro disco.
Como as músicas já estavam quase todas na sua ordem, só me faltava a “Inocência” para chegar àquilo que eu queria, acho que foi uma coisa muito natural, da própria história. E isso era o que me estava a pressionar mais ao início. Quando tive a ideia e não tinha bem tudo acabado… Estava com um bocado de medo. Mas, como foi tão natural, nem consigo dizer bem isso.
Em termos de letras, o que te motiva a escrever são mesmo assuntos pessoais e coisas que estás, de facto, a sentir?
É isso, todas as experiências que tenho… Dizê-las na música é como se as estivesse a filtrar. Faz-me bem a mim e sinto que pode fazer bem aos outros, porque as pessoas identificam-se… Toda a gente já teve um desgosto amoroso ou aquela cena de “não, tu agora vais ficar mal por mim, porque vais perceber o que perdeste”. Toda a gente tem essa fase, por isso é bom nos dois sentidos.
Estavas a falar de fusão de géneros e de ouvires coisas muito diferentes. Obviamente há aqui uma linha de música latina mais contemporânea, cadências mais próximas do reggaeton. São sonoridades que têm estado em grande destaque a nível mundial. Mas sentes que é algo que falta explorar mais em Portugal — neste caso, claro, em fusão com outras coisas?
Cada artista deve explorar, obviamente, aquilo que lhe faz sentido. Para mim, onde encontro essa intensidade é nessa música latina. Por exemplo, o flamenco tem isso, consegues expressar muito bem as emoções — e de uma forma muito intensa. Para mim faz-me sentido. Mas o que faz sentido haver mais cá tem sempre a ver com a maneira como cada artista se procura expressar.
Como é que chegaste ao título, Sozinha e Mal Acompanhada?
Já tinha visto esta frase, a alteração do ditado, já a tinha aqui e tinha um post com essa frase. E ficou-me sempre marcada. Era tudo aquilo que fazia sentido. Não é um “sozinha e mal acompanhada” fisicamente, por pessoas; é um “sozinha e mal acompanhada” por pensamentos, traumas… Quase como se fosse uma auto-sabotagem. E fazia todo o sentido tendo em conta a história que eu queria passar.
Porque é que quiseste fazer o feat com o Lhast no “Culpada”? Como é que ele surgiu durante o processo criativo?
Eu estava no estúdio com o Lunn, nunca tinha feito nada com o Lhast, mas já o tinha conhecido — só que foi uma cena super rápida. E estamos a fazer a música e acabámos o primeiro e segundo verso nesse dia. O Lunn tem aquele beat switch, que parece uma chamada, e parece logo que vai entrar alguém — isso já existia quando fizemos o som. Estávamos a ouvir para ir embora, ele mete aquilo e eu depois disse: “Ya, e agora entrava o Lhast.” E ele disse: “Ah, mas eu vou dizer-lhe”. E eu: “Não, não vais, tenho vergonha” [risos]. “Vais dizer-lhe tu, ele vai gostar de certeza, isto é bué a onda das coisas de que ele gosta”. E foi o primeiro convite que fiz, estava muito nervosa por não saber qual seria a reacção, mas ele aceitou e escreveu logo. E foi super engraçado até, porque ele escreveu coisas relativas às minhas músicas antigas, tem lá uma frase sobre a “Tenho que Pensar”, gosto sempre dessas dicas. Fez muito bem o trabalho de casa.
Mas já tinhas alguma intenção de teres um feat com o Lhast?
Desde o “EViL” e agora do último projecto que fez com o Chaylan, fiquei viciada no “Valencia”. Tem aquelas influências mais latinas. O “EViL” é meio reggaeton, a “Valencia” tem aquele spice também. Fiquei com muita vontade de trabalhar com ele e acho que resultou bem.
Como é que estás a planear o teu 2025 na música? Vais estar mais focada em actuar, já estás a preparar mais música nova?
Posso dizer que este é o ano que eu mais quis viver da minha vida inteira, porque é o ano em que faço 25 anos, no dia 25 de Novembro, em 2025. Então, sempre foi o ano que quis mesmo viver. Era o ano em que estava mais preparada para tudo e acho que, por essa razão, quero mesmo fazer tudo. Já estou a preparar coisas novas para lançar daqui para a frente, não sei quando, mas quero muito, e ao mesmo tempo a focar-me em concertos. É um ano em que não quero parar. Quero fazer tudo o que estiver ao meu alcance e deitar cá para fora e celebrar a vida.