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Texto: Vítor Rua
Fotografia: Pedro Geraldes
Publicado a: 03/12/2024

Da vida em verso ao ritmo do universo.

Madrepérola Cósmica: A Constelação Poética de Capicua

Texto: Vítor Rua
Fotografia: Pedro Geraldes
Publicado a: 03/12/2024

[Os Trajectos de Estrelas de Capicua]

A vida e a obra de Capicua são uma travessia pela vastidão do cosmos, onde a luz e as sombras se entrelaçam numa dança perpétua. Cada palavra que ela profere carrega a densidade do verbo, como se fosse uma estrela a brilhar na escuridão do universo. O hip hop, para Capicua, não é apenas um género musical; é uma galáxia de possibilidades onde se cruzam histórias, sonhos, lutas e vitórias. Como uma estrela que atravessa galáxias, ela move-se com uma força própria, carregando consigo a energia que transforma e ilumina tudo à sua volta.

A sua trajectória não foi linear nem fácil. Desde cedo, Capicua teve de encontrar o seu espaço num cenário musical onde as vozes femininas eram, muitas vezes, abafadas ou subvalorizadas. No entanto, como uma estrela de neutrões, capaz de comprimir a imensa energia em algo compacto e poderoso, ela usou a sua voz para criar uma explosão de significados, construindo um legado que transcende fronteiras, tanto culturais como musicais.

Capicua é mais do que uma simples rapper; ela é uma cartógrafa do invisível. A sua obra não se limita a ser uma colecção de canções, mas sim um mapa estelar onde cada rima, cada metáfora, é um ponto luminoso numa constelação poética. O seu universo é composto de versos que orbitam em torno de temas fundamentais como o feminismo, a justiça social e a autodescoberta. Estes temas, porém, não são abordados de forma superficial; eles são estudados, sentindo-se a sua pulsação em cada linha que ela declama. É como se cada rima fosse um planeta em órbita, com uma gravidade própria que atrai o ouvinte para um campo de reflexão profunda.

A comparação com Emily Dickinson não é casual. Tal como Dickinson, Capicua escreve sobre aquilo que não se vê, sobre o indizível. Dickinson falava da morte e da natureza de uma forma que desafiava as convenções da sua época; Capicua faz o mesmo com o patriarcado, a injustiça e as estruturas de poder que governam o nosso tempo. Em ambos os casos, há um eco de resistência na arte que produzem. Dickinson resistiu às expectativas da sua condição feminina no século XIX, e Capicua resiste à marginalização das vozes femininas no hip hop e na sociedade contemporânea.

A arte de Capicua, como o cosmos, é uma dança de forças. O ritmo da sua poesia não é apenas algo que se ouve, mas algo que se sente nas entranhas, que ressoa como as ondas gravitacionais deixadas por um corpo celeste em movimento. As suas palavras possuem o poder de expandir horizontes, de desafiar o status quo, de imaginar novas possibilidades. Cada verso que ela profere é uma espécie de alquimia, onde as palavras são transmutadas em acção, onde o verbo deixa de ser abstracto e se torna uma força concreta de mudança.

Mas Capicua não dança sozinha nesta imensidão cósmica. A sua obra é um constante diálogo com o outro, com o mundo, com o passado e com o futuro. Há um diálogo permanente entre ela e as vozes femininas que a antecederam, que a inspiraram, e que ela evoca com frequência nas suas rimas. Nomes como Chimamanda Ngozi Adichie, Malala Yousafzai, ou Nina Simone aparecem nas suas letras como estrelas-guia, iluminando o caminho para as gerações futuras.

E se a arte é uma forma de resistência, como Emily Dickinson nos ensinou, Capicua leva essa ideia a um novo patamar. O seu hip hop é uma forma de luta, uma batalha cósmica contra as forças de opressão que silenciam as vozes mais frágeis. No entanto, há também ternura, poesia e beleza no seu trabalho. Tal como as galáxias que contêm tanto caos como ordem, a obra de Capicua contém tanto revolta como amor, tanto denúncia como cura.

Capicua é uma viajante sideral, navegando pelos mistérios do universo através da poesia. Cada canção sua é uma descoberta, uma nova estrela a ser mapeada no vasto firmamento da experiência humana. A sua capacidade de desconstruir o patriarcado, de questionar as normas estabelecidas e de criar novas rotas para a liberdade faz dela uma alquimista das palavras, alguém que transforma o peso da realidade em algo leve, transcendente.

No final, Capicua lembra-nos que a vida, tal como o cosmos, é uma constante dança de forças opostas, e que cabe a nós decidir como navegamos por entre essas estrelas. Ela, com sua arte, traça o caminho para uma nova forma de existir, uma nova maneira de ser livre. E ao fazê-lo, ela não só ilumina o seu próprio percurso, mas também o daqueles que, como ela, buscam encontrar a sua própria trilha no infinito estrelado da vida.

[Madrepérola: O Pulsar de um Novo Universo]

Em 2020, enquanto o mundo enfrentava as tempestades de uma nova era, Capicua, como uma estrela em colapso que renasce em supernova, deu à luz um novo universo: Madrepérola. Este não é apenas mais um álbum no vasto cosmos musical; é uma obra que emerge das profundezas da experiência humana, como uma estrela que condensa em si o brilho e a escuridão de tudo o que já viveu. Gravado durante um período de transformação íntima, entre os ecos da maternidade e o silêncio das noites solitárias, Madrepérola ressoa como uma constelação de emoções cristalizadas, onde cada canção é uma galáxia em si.

Tal como uma ostra que, em resposta à adversidade, se fecha e transforma a dor em algo precioso, Capicua usou o tempo de introspecção para gerar um som que transcende a mera música. Madrepérola é mais do que um álbum; é um reflexo de um processo de gestação, de cura e de autossuperação. Cada nota, cada palavra, ecoa como o brilho cintilante de uma pérola recém-formada, revelando a beleza que surge das profundezas mais insondáveis.

Em “Passiflora”, a voz de Capicua atravessa o espaço como o pulsar de uma estrela distante, ora suave, ora intensa, navegando por entre versos que falam da fragilidade da vida, mas também da sua força. A melodia flui como uma corrente cósmica, carregando consigo os mistérios da criação, da maternidade e do renascimento. Nesta faixa, sentimos o ritmo do universo no peito, como se a vida fosse simultaneamente breve e eterna, um lampejo no grande pano de fundo estelar.

“A Minha Ilha” emerge como um planeta solitário, rodando nas órbitas de um universo onde a independência e o isolamento são faces da mesma moeda. Capicua constrói aqui uma metáfora delicada: a ilha como símbolo de autossuficiência, mas também como uma fortaleza onde o feminino se encontra consigo mesmo. O empoderamento feminino, tão presente na sua obra, aqui toma a forma de um planeta habitado por uma voz que é, ao mesmo tempo, singular e universal.

O refrão de Madrepérola, “Ostra feliz não faz pérola”, não é apenas uma frase de efeito; é um mantra cósmico, uma verdade universal sobre a criação através da adversidade. Assim como as estrelas nascem da fusão de elementos em caos, as pérolas são o resultado de um processo de transformação que envolve tanto dor quanto beleza. Capicua, ao transformar as suas vivências em música, convida-nos a contemplar as nossas próprias dores e a ver nelas o potencial para a criação.

Em Madrepérola, o feminino é celebrado em toda a sua pluralidade e complexidade. Capicua invoca mulheres que, ao longo da história, iluminaram o caminho da resistência, como Mandela, Malala e Amália. Cada uma delas é, aqui, uma estrela num firmamento de vozes que ecoam a resiliência, a força e a beleza de quem se ergue contra as adversidades. Como quem desenha constelações no céu, Capicua junta estas figuras num só universo, criando uma galáxia onde o feminino brilha intensamente, em todas as suas formas.

A colaboração com Karol Conká em “Madrepérola” é o ponto alto deste sistema solar de mulheres poderosas. Como duas supernovas em colapso, as suas vozes encontram-se e explodem num grito de independência e força. A canção ressoa como um hino de liberdade, uma celebração da resistência feminina, que se eleva acima das pressões do mundo como uma estrela que brilha mais forte quanto maior é a sua luta.

E tal como a ostra se fecha em torno da sua pérola, Capicua encerra este álbum com a sabedoria de quem sabe que, no fundo de cada verso, reside um tesouro. Madrepérola é uma obra que nos lembra que a arte é o processo de transformar dor em beleza, caos em harmonia, e que cada canção pode ser um fragmento de um universo maior, onde as estrelas brilham por terem sobrevivido às tempestades da existência.

Ao ouvir Madrepérola, somos convidados a navegar por entre galáxias interiores, descobrindo em cada nota o eco de uma história maior, uma história que é tanto pessoal quanto universal. Capicua, como uma verdadeira alquimista cósmica, transforma o ordinário em extraordinário, e convida-nos a fazer o mesmo nas nossas próprias vidas, lembrando-nos sempre que, tal como no cosmos, a criação e a destruição são forças indissociáveis, e que é no espaço entre elas que reside a verdadeira arte.



[Madrepérola Cósmica: Uma Dança Filosófico-Musical]

Na vastidão do álbum Madrepérola, cada letra é uma estrela que se inscreve numa constelação maior, uma rede de significados que pulsa com a energia da criação, da dor e da superação. A frase que ressoa como um mantra, “Ostra feliz não faz pérola”, sintetiza uma verdade ancestral: a criação não é fruto do conforto, mas da tensão e da adversidade. Este paradoxo, presente desde os primórdios da humanidade, é o núcleo gravitacional em torno do qual giram as palavras de Capicua. Tal como uma estrela que se forma sob a pressão esmagadora do seu próprio peso, o processo criativo, para Capicua, nasce da compressão, da resistência à dor, e brilha intensamente no firmamento de sua obra.

A composição “Madrepérola” não é somente uma canção; é um manifesto cósmico, onde cada nome citado — Chimamanda, Chavela, Sade, Mandela — torna-se uma estrela no céu da luta, da resistência, do renascimento. Cada uma dessas figuras icónicas representa uma narrativa de superação, um brilho que sobreviveu à escuridão. Capicua, ao invocá-las, traça linhas invisíveis no céu da música, criando uma constelação que nos orienta pela sua história de empoderamento feminino. Estes nomes não são apenas referências culturais; são faróis de luz no cosmos da injustiça, iluminando o caminho para quem, como ela, resiste e se reinventa.

A citação a Mandela, por exemplo, reflecte a verticalidade moral, a postura imbatível que Capicua adopta na sua música. “Sambo como Jojo samba, se caio, caio de pé” — este verso é um eco das leis cósmicas da resiliência, onde o colapso precede a renovação. Capicua insinua que, tal como estrelas que colapsam em supernovas para dar origem a novos astros, as quedas na vida podem ser a origem de uma nova forma de existir. Aqui, o feminino encontra a sua força, não na ausência de desafios, mas na sua capacidade de cair e se reerguer.

Musicalmente, Madrepérola funciona como um sistema planetário, onde cada elemento — dos beats à voz — orbita em torno de um centro gravitacional poderoso: a luta pela justiça e pela autoafirmação. Os beats servem como o núcleo denso que mantém coesa a estrutura sonora, enquanto a voz de Capicua é o planeta livre que orbita, traçando trajectórias imprevisíveis, mas sempre harmónicas. Há uma dança de elementos que se complementam, como se o álbum inteiro seguisse as leis da gravidade cósmica, onde o som e a palavra coexistem em equilíbrio dinâmico.

A parceria com Karol Conká em “Madrepérola” amplia este universo, trazendo uma dimensão global à luta que Capicua retrata. O encontro de duas vozes fortes, vindas de contextos distintos mas ressoando numa mesma frequência de resistência, é como um alinhamento de planetas — raro, poderoso e transformador. Essa conexão ultrapassa as fronteiras da língua e do ritmo, criando uma harmonia entre as lutas vividas por mulheres em diferentes partes do mundo. A canção torna-se assim um eco universal, onde as vozes de Capicua e Karol Conká vibram como corpos celestes em ressonância, amplificando o impacto uma da outra.

Cada referência, cada figura evocada, não é meramente decorativa; é um ponto de ancoragem num sistema de significados onde o feminino resiste, persiste e brilha. Assim como uma estrela que, mesmo depois de explodir, continua a iluminar o espaço ao seu redor, as mulheres celebradas por Capicua em Madrepérola são faróis na escuridão, lembrando-nos que a luta continua mesmo após as maiores adversidades. O feminino, em Capicua, é uma força cósmica que atravessa o tempo e o espaço, deixando rastos de luz que iluminam o caminho para outras gerações.

No fim, Madrepérola é mais do que uma obra de arte; é uma dança cósmica entre a dor e a beleza, entre a resistência e a criação. Capicua, com a precisão de uma astrónoma das palavras, mapeia este universo com uma voz que é, ao mesmo tempo, ancorada na Terra e projectada para o cosmos, navegando por entre constelações de significados, traçando novas rotas de liberdade e superação.

Este é o seu legado: uma constelação de palavras, uma dança de sons, um sistema planetário de luta, onde o feminino brilha com a força de mil sóis. E neste universo poético-musical, Capicua é a estrela-guia que nos convida a seguir sua luz, a resistir e, como ela, a criar a partir das nossas próprias adversidades.

[A Sinfonia Celestial de Capicua]

Ao mergulharmos na trajectória de Capicua, é impossível não sentir que estamos diante de uma explosão de vida, como se cada momento da sua existência fosse uma partícula cósmica em constante transformação. Como uma nebulosa, a sua obra é densa e expansiva, carregada de energia e potencial. Cada rima, cada verso, é uma colisão de ideias, uma fusão de experiências que, ao chocar-se, geram novas formas e significados.

A menina que cresceu entre as ruas do Porto e os ecos urbanos do hip hop é, hoje, uma estrela madura que canta sobre as complexidades da vida — sobre maternidade, dor, e, sobretudo, sobre superação. Mas a sua voz não se limita ao registo pessoal; ela transcende o que é imediato, enraizando-se em algo maior, algo que ecoa para além dos limites do quotidiano. Capicua conecta as suas experiências terrenas a um tecido cósmico maior, e é aí que reside a sua força: na capacidade de transformar o individual em universal, o particular em algo que ressoa com o todo.

A vida de Capicua é como a formação de um corpo celeste. No início, foi uma concentração de matéria e energia, um ponto quase invisível que foi crescendo e adquirindo massa à medida que novas influências gravitavam em torno de si. Com o tempo, essa massa crítica foi atingida, e o que antes era potencial, tornou-se luminoso. Hoje, Capicua é um corpo celeste em plena expansão, cujas fronteiras musicais e poéticas ainda estão a ser traçadas no firmamento da música portuguesa.

Mas o que a torna verdadeiramente singular é a forma como, em meio ao caos, ela ergueu a sua voz e a transformou numa força cósmica. As suas palavras, como partículas de luz, viajam pelo espaço da nossa existência, iluminando zonas de sombra e revelando o que, muitas vezes, permanece oculto. Há em Capicua uma qualidade quase alquímica: o poder de transmutar o caos em ordem, a dor em arte, o silêncio em som. Como Emily Dickinson, que encontrou no invisível o essencial, Capicua também nos lembra que aquilo que não podemos ver é o que mais profundamente nos transforma.

E tal como as estrelas que brilham muito depois de terem morrido, a obra de Capicua continuará a ecoar pelo vasto céu da existência. As suas palavras — vivas, luminosas, carregadas de significados múltiplos — não são apenas registos do seu tempo; são constelações que continuarão a ser lidas e interpretadas por quem se aventurar a olhar para o firmamento musical que ela ajudou a desenhar.

No fim, a sinfonia celestial de Capicua é a de uma mulher que, partindo do chão, elevou-se às estrelas. A sua música é uma viagem pelas galáxias interiores do ser humano, onde cada canção é uma órbita que nos aproxima mais de nós mesmos. Ela é uma arquitecta de constelações, e o seu legado continuará a brilhar no infinito, como um farol no céu da cultura portuguesa, iluminando futuros caminhos para aqueles que ainda hão de vir.

Este é o seu legado: uma constelação de palavras, uma dança de sons, um sistema planetário de luta, onde o feminino brilha com a força de mil sóis. E neste universo poético-musical, Capicua é a estrela-guia que nos convida a seguir sua luz, a resistir e, como ela, a criar a partir das nossas próprias adversidades.


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