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Fotografia: Diana Matias
Publicado a: 03/03/2025

Um arranque desapontante para a nova sala de espectáculos lisboeta.

Humana Taranja no Coliseu Club: um tubarão num aquário

Fotografia: Diana Matias
Publicado a: 03/03/2025

Dia 1 de março prometia ser um dia de celebração. Em primeiro lugar, pela abertura de uma nova sala de espetáculos na cidade de Lisboa, que tem perdido vários espaços culturais nos últimos tempos. Falamos do Coliseu Club, que tem, no entanto, a possibilidade de ser mais do que apenas outro lugar onde se ouvem talentos emergentes, podendo ocupar um espaço importante na progressão natural de uma banda ou artista musical nacional, por ser equiparável em tamanho a um Musicbox, mas fazendo parte do complexo do histórico Coliseu dos Recreios. Instituição essa que, por mais que se possa criticar a sua recente programação, é associada a boas experiências no que toca às características da sala principal e à qualidade de som nos concertos dos artistas que por lá passam. Além de ser a estreia do Coliseu Club, a banda que teve a oportunidade de o abrir é mais do que merecedora desse selo de aprovação. Os Humana Taranja, que lançaram EUDAEMONIA, o seu segundo LP, em outubro do ano passado, estão a afirmar-se como uma das próximas grandes bandas portuguesas, não só pela qualidade do álbum que apresentaram, mas precisamente pelas suas performances consistentemente notáveis ao vivo. Porém, o resultado foi desapontante, e é uma considerável mancha no início do percurso de uma sala que tem tudo para ser importante no circuito musical português.

Comecemos pelos pontos positivos. Para quem não estava familiarizado com a banda, ou pelo menos não tinha tido ainda a oportunidade de os ver ao vivo, não terá saído descontente do concerto. A capacidade que os músicos têm de conquistar qualquer plateia que lhes ponham à frente, pela sua personalidade e energia contagiante, esteve presente nesta performance como em qualquer outra. O público saltou, cantou, e deixou-se levar pelo pop-rock marginal dos Humana Taranja, e mesmo não se tendo chegado perto da lotação máxima do espaço, acreditamos que aqueles que se juntaram nas primeiras filas nem sequer se aperceberam disso, tal era o seu entusiasmo, potencializado pela banda. Com direito a ouvir o novo álbum na integra, e mais algumas das canções mais populares do seu reportório, a festa contou também com a presença dos suspeitos do costume: a belíssima voz de EVAYA em “CASA”, e o avassalador Alex D’Alva Teixeira em “DEIXA ARDER”, que incitou ao mosh assim que pisou o palco.

A fórmula “LONGE”-“GUERRA”, com que começam EUDAEMONIA e que já tinha sido executada no concerto de apresentação do álbum na Galeria Zé Dos Bois, foi também usada no último sábado, e voltou a resultar excelentemente como forma de energizar o público, mas o alinhamento conteve algumas surpresas, nomeadamente “Copo de Vinho” do seu EP Quase Vivos, lançado em 2020, que não têm tocado em concerto nos últimos tempos, como o próprio Guilherme Firmino, vocalista e guitarrista, reconheceu. O seu duo dinâmico com Filipa da Silva Pina nas vozes não desapontou, como já nos habituaram (e que até torna as adições de EVAYA e Alex D’Alva Teixeira ao LP menos enriquecedoras, por nos tirarem tempo para ouvir as duas vozes em harmonia), sem que, por isso, se dever valorizar menos a qualidade de David Yala, Marta Inverno e Afonso Ferreira, evidentemente. 

É uma banda em que se nota a química entre os seus membros, especialmente no formato ao vivo, o que é indicativo da forma como o projeto nasceu e cresceu, à boleia dos recursos da Hey, Pachuco!, e da vontade de criar, sem ainda saberem muito bem tocar os seus instrumentos. Citando Miguel Rocha, “se [hoje] ainda não sabem, disfarçam bem”: é sempre prazeroso ouvir os 5 jovens músicos oriundos do Barreiro, e é importante mencionar que uma das grandes razões pelas quais o som do grupo ao vivo é tão cativante é o trabalho de Miguel Gomes (aka Chinaskee), o técnico de som que acompanha o projeto. É raro que uma banda que envolve tanta instrumentalização e que pede potência, mas também nitidez nas suas performances consiga apresentar-se da forma com que se apresentou, por exemplo, no seu concerto na ZDB. 

Porém, as características do Coliseu Club não os permitiram atingir esse nível no sábado passado. Seja devido à sua arquitetura e à falta de um tratamento acústico adequado, ou ao equipamento fornecido pela organização, o espaço foi limitador para que a proposta da banda brilhasse ao vivo. Quando as condições são adequadas, EUDAEMONIA ganha gravitas e catarse ao vivo, mas isso não se verificou. Obrigados a escolher entre a potência e a nitidez que mencionámos, não é justo criticá-los por manter a energia que manteve o público de pés no ar. Pela mesma moeda, e considerando mesmo assim que, para quem não esteja já habituado a melhor, foi entregue uma boa experiência apesar de tudo, é difícil culpar o trabalho de Miguel Gomes.

Se o Coliseu Club quer competir com as maiores salas de Lisboa com programação emergente, tem também de competir a nível das características técnicas de salas como a ZDB ou o Musicbox, e usando este concerto como referência, falham nesse sentido. Não estamos sequer a falar de uma banda que queira propriamente puxar pelos limites do ruído, mas os ouvidos de muitos na plateia zumbiam no final do concerto. Foi, por isso, apesar dos melhores esforços dos Humana Taranja, e sem culpa nenhuma do seu lado, uma noite desapontante. Esperemos que sejam apenas dores de crescimento, e não uma indicação daquilo que o Coliseu Club é capaz de oferecer num futuro próximo. Até lá, a apresentação de Venham Mais Vinte, o novo disco de Duarte, o fadista eborense, ainda este mês, e o evento Santo Antão Jazz Clube, com a curadoria da Rimas e Batidas e as performances de YAKUZA e SAMALANDRA serão testes menos exigentes à sala que os acolhe, mas só o futuro dirá se o Coliseu Club se afirmará como o espaço relevante que tem a capacidade de ser. Sem melhorias nos seus aspetos técnicos, no entanto, isso dificilmente acontecerá.


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