O artista-investigador Henrique J. Paris apresenta esta sexta-feira, 28 de Março, uma conferência-performance no Teatro do Bairro Alto, em Lisboa. Trata-se de uma iniciativa integrada na sua série Humming as a Praxis, que procura questionar simbolicamente — a partir de dentro — espaços, instituições ou regimes de poder que ainda se regem por lógicas e arquétipos coloniais.
Declaradamente subversiva e efémera — sem se conhecerem à partida todos os contornos daquilo em que consiste — a apresentação pode ser vista pelo público a partir das 18h30. Os bilhetes estão à venda por 5€.
O trabalho de Henrique J. Paris tem-se cruzado regularmente com a música, sobretudo aquela que também questiona as lógicas coloniais que persistem, tendo o artista-investigador assinado um EP em conjunto com o colectivo RS Produções, Ressurgência, editado em 2024. Em declarações ao Rimas e Batidas, antecipa a conferência-performance de sexta-feira.
De que modo é que surge esta conferência-performance no âmbito de uma série que já existia?
O formato de conferência-performance surgiu a partir de um convite feito pelo Teatro do Bairro Alto para apresentar um trabalho no contexto da actual programação de discurso, dirigida pela Melissa Rodrigues, centrada em Imaginação Radical – Tempo Espiralar e Libertação. Acredito que esta encomenda, que expande as iterações anteriores de Humming as a Praxis (já apresentadas em formato de palestra sonora), surgiu como forma de aprofundar a produção de conhecimento em simultâneo com a performatividade. Ainda que continue a explorar relações sonoras e espaciais, a série mantém como fio condutor a análise crítica de edifícios coloniais; nas suas materialidades e simbologias — e de como continuam a moldar as nossas relações com o território.
Como é que defines Humming as a Praxis? E como é que esta série já se materializou ao longo do tempo? De que formas é que foi apresentada ou concretizada?
Humming as a Praxis nasce do meu interesse pelos sons e gestos humanos quotidianos como o murmurar (humming), os passos, o silêncio ou o grito; enquanto práticas capazes de activar memórias, criar resistência e situar ligações colectivas. Ao longo do tempo, estas intervenções têm sido atravessadas por referências e diálogos diferentes, mas sempre inspiradas pelos movimentos de libertação. Cada apresentação constrói uma narrativa aberta, onde som e espaço dialogam com contextos históricos específicos. A primeira iteração aconteceu no Victoria & Albert Museum, em Londres; e a segunda no Padrão dos Descobrimentos, em Lisboa. Ambas reflectiram em torno do que significa fazer ressoar discursos anticoloniais em espaços que ainda operam sob uma ordem colonial, sempre com o objectivo de interrogar aquilo que permanece no limiar do audível e do visível.
A ideia é que esta conferência-performance seja um momento único, irrepetível? Embora o conteúdo da performance não seja divulgado antes, há algumas pistas ou indícios que queiras dar nesse sentido? Vai abordar algum tema em concreto?
Sim, parte do conceito reside na efemeridade e na singularidade do momento. Apesar de a conferência-performance dialogar com temas recorrentes, cada apresentação é moldada pela energia específica do público, do lugar e do contexto político em que é apresentada. O espaço “teatro” me obrigou a repensar o que isso significa e como se estabeleceu na Grécia! Me levou a abordar o papel na construção de subjectividade do homem negro em Lisboa e as fontes que partilhamos nas nossas memórias colectivas e modalidades de fé. Já que tenho tocado em questões relacionadas com edifícios opressores, cartografias de silêncio e resistência; práticas sonoras ligadas à diáspora, sem dúvida. Trago algo/alguém que por muito tempo tem moldado a consciência crítica nos meios musicais como nos sociais-políticos. Sons que cresci a ouvir.
Sentes que é uma forma de procurar dar contexto ou de repor alguma justiça simbólica quando se fala, como se pode ler na sinopse divulgada, de “arquétipos e construções coloniais ainda financiados para existirem hoje em áreas metropolitanas”?
Sem dúvida propor justiças simbólicas. O objectivo é trazer à superfície aquilo que muitas vezes permanece inaudível. Estes “arquétipos e construções coloniais” não são apenas objectos do passado; continuam a ser reproduzidos e financiados nos nossos espaços contemporâneos! O murmúrio, por exemplo, entra aqui como um dispositivo simbólico de desmantelar e contextualizar estruturas de poder ao som da nossa liberdade — uma forma de subversão e de resgate simbólico de memórias marginalizadas.
RS Produções e Henrique J. Paris lançam Ressurgências este mês