Ao longo do último quarto de século, a cantora-compositora Haley Fohr mergulhou nos espectros mais profundos da pop, da country e da folk, perdendo-se nas tessituras da ambiguidade à medida que explorava os diferentes cantos da sua elusiva personalidade, que desdobra a partir de diferentes alter egos. Em Halo On The Inside, o oitavo disco que assina como Circuit des Yeux, a realidade confunde-se mais do que nunca com o mito. Percebemo-lo no refrão tortuoso de “Anthem of Me”, barítono imponente, reconhecido pelo seu alcance vocal de quatro oitavas, cantando sobre as amarras da mente, enquanto uma contínua e marcada percussão metálica nos remete para o campo gravitacional de Scott Walker em Bisch Bosch.
Podia ser mais um produto da pandemia, mas não é. Halo On The Inside é o resultado de um profundo processo de clausura auto-imposta, com a artista a isolar-se durante meses entre as paredes do seu estúdio em Chicago, onde se tem vindo a afirmar como figura central da cena experimental local. Para tal, adotou o turno da noite, trabalhando madrugada adentro até o sol raiar. Isso é evidente no choque electro-industrial que permeia a atmosfera do seu novo disco, capturando o impulso criativo experienciado pela artista durante o processo de gravação.
Na jornada interior da norte-americana, o reflexo é um espelho quebrado do mundo que a rodeia. “Megaloner”, um dos singles que apresentam Halo On The Inside, desenvolve-se a partir de uma distorcida linha de baixo que pulsa por cima do rastilho deixado por uma guitarra blues. “Canopy of Eden”, logo a seguir, contrasta as orquestrações do antecessor -io com padrões de sintetizador elípticos e uma batida pugilista, à retaguarda, a conduzir o compasso, antes de “Skeleton Key” nos afastar do centro com uma balada lúgubre e desossada. Igualmente disforme é “Cathexis”, tratado de exploração e auto-descoberta, com voz, corpo e mente a desintegrarem-se num mesmo plano existencial.
É música que desafia qualquer tentativa de audição passiva, mas nos 40 minutos de Halo On The Inside podemos encontrar também momentos de libertação e manifestação carnal. “Truth”, por exemplo, estica os limites da pop dançável, com um refrão memorável (a máxima “truth is just imagination of the mind”, repetida até à exaustão) e uma descarga esfuziantemente gótica a entregar-nos por completo ao abandono da pista de dança. Uma réstia de esperança vislumbra-se na luminosa “Organ Bed”, igualmente catártica e contida na forma como trata o histrionismo de um saxofone flutuante, antes de o órgão fracturado de “It Takes My Pain Way”, emprestado aos drones harmoniosamente densos de Tim Hecker, nos trazer de volta ao pântano da decadência. Depois resta o silêncio, assombroso e assombrado.