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Fotografia: Matthew Septimus
Publicado a: 11/03/2025

O músico norte-americano tem três datas ao vivo em Portugal.

Bill Frisell: “O som deste trio é muito mais do que as notas e as músicas”

Fotografia: Matthew Septimus
Publicado a: 11/03/2025

Bill Frisell é um dos mais dedicados estudiosos do papel da guitarra na grande paisagem musical americana e do jazz ao rock, da folk ao country e blues, não há nenhum recanto que não tenha explorado com as seis cordas do seu instrumento. Com o contrabaixista Thomas Morgan e o baterista Rudy Royston, assinou, por exemplo, o muito elogiado Valentine na incontornável Blue Note Records.

Na breve conversa mantida com o Rimas e Batidas, Frisell explica que a relação que construiu com estes companheiros de palco é profunda e ultrapassa em muito a música: tem a ver com a partilha de raízes culturais, com a vivência do dia a dia, com a confiança plena.

Durante quase quatro décadas, Bill Frisell tocou em algumas centenas de álbuns e com músicos tão diversos quanto John Zorn, Elvis Costello ou Lucinda Williams, facto que lhe confere uma amplitude de vistas assinalável, algo que se poderá agora aplaudir nos concertos que vai assinar esta noite (11 de Março) no Auditório de Espinho, amanhã (12 de Março), em Coimbra, no Teatro Académico de Gil Vicente (programação JACC / Salão Brazil) e na quinta-feira (13 de Março), em Lisboa, na Culturgest.



Obrigado por aceitar esta chamada. É um prazer estar a poder conversar consigo. Tenho aqui o flyer para o seu concerto em Coimbra, a cidade onde eu nasci.

Oh, ótimo!

Traz consigo o Thomas Morgan e o Rudy Royston. Este é um trio com muita estrada. Passado todo este tempo, eles ainda o surpreendem?

Sim, todas as noites. É por isso que eu espero sempre, e o que realmente ainda continua a acontecer. Eu nunca sei o que vai acontecer. Há duas coisas. Há tanta confiança e tanta história que podemos tocar qualquer coisa que me possa vir à cabeça. Nós nunca planeamos o que iremos fazer antes de subirmos ao palco. Então, nós chegamos ao palco e simplesmente começamos a tocar… É difícil descrever como, na música, uma coisa vai levar para a outra e não há nada que eu possa fazer que eles não pareçam saber de alguma forma. Ainda hoje continua a ser uma surpresa para mim, então eu espero que seja para eles também, tal como eu espero que seja para o público [risos].

Como é possível construir uma relação tão profunda, ao ponto de você não precisar de falar sobre nada e a música simplesmente fluir? São muitos jantares juntos? O que acha que explica esse tipo de relação próxima que vocês têm?

Sim, é muito mais do que apenas as notas e as músicas. É como você disse, isto nasce de jantarmos todos juntos e tanto mais que ultrapassa o palco. O Rudy, o baterista, ele nasceu em Denver, Colorado, a mesma cidade onde eu cresci. Ele tem 20 anos a menos do que eu, mas há tantas coisas que temos em comum por termos sido crianças na mesma cidade — o andar no bicicleta numa determinada rua e muitas outras coisas que compartilhamos. Mas muita desta química vem de estarmos juntos como pessoas. Nós viajamos, nós tocamos… É incrível quando eu penso no que por vezes fazemos num gig, em que viajamos por dois dias, chegamos lá, não dormimos nem comemos, depois tocamos por uma hora e vamos embora. Então o concerto é como que uma pequena fracção do que somos, dado todo o tempo que passamos juntos. Nós somos amigos muito próximos também. E isso sente-se na música, já que ninguém se tem de preocupar com ela. Temos de confiar e ajudar-nos uns aos outros tanto na música como em tudo o resto que fazemos. Quando chego ao aeroporto e tenho muitas malas, o Thomas carrega a guitarra por mim. A mesma coisa acontece quando estamos a tocar e eu cometo algum erro, eles fazem a coisa soar como se eu tivesse feito aquilo de propósito [risos].

Essa é a definição de amizade pura. Você gravou o Valentine com eles e também o When You Wish Upon a Star, em que também entra a Petra Haden, e eles tocam ainda no álbum Orchestras. Você trabalhou com eles em contextos muito diferentes. Há algum plano para novas gravações com esse trio?

Nós acabámos de fazer alguns concertos em Nova Iorque, em que eu, o Rudy e o Thomas nos fizemos acompanhar por Jenny Scheinman no violino, Hank Roberts no violoncelo e Eyvind Kang na viola. Somos um sexteto. Talvez ainda seja um bocado cedo para o confirmar, mas estou à espera que o meu próximo álbum seja no contexto desse projecto.

Dizia-me há pouco do vosso roteiro internacional que vocês acabam por perder muito tempo em viagens para chegar a um local e tocar apenas por uma hora. Apesar disso, apesar das complicações logísticas, o chegar ao palco ainda tem sabor de recompensa?

Sim, sim. A forma como nos entendemos musicalmente é incrível e isso faz-me sentir muito sortudo. Aquela uma hora em que vamos estar a tocar pode ser como que uma vida inteira, é a coisa mais incrível que se pode sentir quando se está na música. É isso que faz com que tudo seja muito valioso. Às vezes eu penso: “O que é estamos a fazer?! Por que estamos a fazer isto?” Todo esse processo da viagem pode ser desmotivador, mas assim que se começa a tocar… Entra-se neste mundo maravilhoso e fica tudo bem.

Eu estava a olhar para o seu calendário e vejo que tem muitos espectáculos até Julho. A minha pergunta é: vocês vão tirar férias depois disso? [Risos]

Eu não sei sequer o que são férias, porque eu só quero tocar [risos]. Eu também gosto de ter tempo em casa e estar só a tocar a minha guitarra ou o que quer que seja, mas parece que a altura em que eu sinto mais paz é quando eu estou a tocar ao vivo, especialmente agora, quando o mundo está a dar em louco. A única coisa que eu sei fazer é tentar continuar a tocar.

Isso faz sentido. Talvez seja uma pergunta geek, mas com que tipo de guitarra você viaja agora para estes concertos?

Para esse concerto em específico eu não sei [risos]. Mas geralmente é algum tipo de Telecaster, uma guitarra com a qual é muito fácil viajar. Só tive de comprar uma mala de transporte cara [risos]. Eu costumava tentar levá-la no avião comigo e isso agora é impossível, tem de ser deixada com a outra bagagem. Até agora não me chegou nada partido, mas volta e meia eles perdem alguma coisa.

Eu tenho certeza que isso não vai acontecer desta vez. Do seu trabalho a solo aos projectos que vem a desenvolver com orquestras, temo-lo visto fazer um pouco de tudo, parece. Há alguma configuração específica que você ainda não explorou e que gostaria de tentar?

Eu acho que é mais sobre… Eu não penso muito sobre os instrumentos com os quais eu quero tocar, mas é mais sobre as personalidades… Eu estou sempre a encontrar novas pessoas e eu acho que é isso que me atrai. Ao gostar de estar com essas pessoas, vou querer fazer algo com elas. E eu tive imensa sorte de tocar com tantas pessoas diferentes. É difícil dizer, mas é mesmp mais sobre a personalidade, aquilo que me atrai, e não tanto o pensar numa instrumentação específica, talvez.


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